O Buscador da Verdade, em suas investigações, não raro, encontra-se imerso nas dúvidas que o assaltam tão logo ele perceba quão distante pode se achar a Fé Ideal dos atos reais dos seres humanos. De um lado, os ares de fábula do que dizem acerca de Cristo e de Maria, exaltado pela Igreja oficial; de outro, a marcante presença do mesmo Cristo Real, chegando a ser até mesmo atraente ao mais feroz dos céticos.
Andiamo!
No intenso clima místico que sinto nas celebrações solenes da Igreja, de um estilo marcadamente ou romano ou oriental, será possível que eu encontre uma Sublime Via? Poderei eu achar o Tesouro, envolto em dois mil anos de pensamentos degenerados, que reconcilie o Rabi Nazareno à egrégora [1] nutrida, fora da Palestina, a partir de seus elevados ensinamentos?
Erros são sempre erros. Mas, fico realmente triste pela importância que crentes de tantas religiões e seitas dão aos intermináveis debates doutrinários, enquanto o filet mignon da Fé, que nos deve guiar ao Bem Supremo, é esquecido. Sempre deixamos para depois, preferindo o calor dos debates e a euforia de uma pretensa verdade ao acalanto da Caridade redentora.
De vez em quando, me pergunto se faria alguma diferença se Jesus não tivesse existido ou, ao menos, se não tivesse vindo nascer nesse pântano. Pois, fosse qual fosse a religião, os povos deteriorariam o cerne da Mensagem e o transformariam num ninho de psicoses e delírios, sempre guiados por “pastores santos” com procuração para representar Deus na Terra. Obviamente, os grandes pontífices das religiões são escolhidos para tal encargo antes mesmo de nascerem. É a tal Providência em ação. Mas, as cabeças nem sempre conseguem comandar os membros dos corpos. Muitas vezes, até pioram seu estado…
Tento encontrar, no âmbito da espiritualidade cristã, essa Sublime Via, esse caminho, ao que me parece, há tanto tempo esquecido, cujas lembranças foram soterradas sob toneladas de ideias tolas e fantasias, quando não usadas para fins políticos ou ideológicos. Afinal, do que eram chamados os primeiros seguidores do Nazareno, senão de Adeptos do Caminho? [2] Que Caminho era esse? Era um Caminho simples, cheio de ensinamentos igualmente simples, os quais não deveriam ter sido arquivados em milhares de breviários e alfarrábios eclesiásticos, senão que vividos e postos em prática constante.
Não fazia muito tempo desde o martírio de Pedro na colina Vaticana quando as disputas já pululavam em Roma, com intrigas e lutas por poder. A rivalidade entre os pretendentes ao mandato de Pedro da Galileia, bem como a corrida pela posse da “verdade”, foi acirrada para ver quem seria o “cabeça” das ovelhas destinadas ao matadouro nos Circenses, em torneios medonhos dos que melhor se ofereciam às feras. A obrigação da fidelidade no testemunho se confundia com o delírio dos que se entregavam alegremente ao esmagamento ósseo nas bocas dos leões. A Fé se misturava à histeria, ao frenesi místico, de certa forma, suicida.
Pôncio Pilatos, ao que tudo indica, não foi martirizado. José de Arimateia, segundo algumas tradições, teria aproveitado seus negócios na longínqua Bretanha e ido se tornar o primeiro Apóstolo cristão da Inglaterra. O que eles sabiam da Verdade e da mensagem de Jesus? O que eles entendiam de Teologia “católica”? Provavelmente, quase nada. Mas, Pôncio Pilatos ousou perguntar ao Mestre: Quid Veritas? O que é a tal Verdade, afinal?
O pouco que ouviram de Jesus ou fizeram após a partida deste, talvez, tenha redimido tanto a alma de Pôncio Pilatos como a de José de Arimateia, o rico comerciante e membro do Sanhedrin (Sinédrio) de Jerusalém. Eram, os dois, “católicos” ou “pentecostais”? Não, ali tínhamos um político romano confuso e um judeu fariseu. Da mesma forma que o bom samaritano venha a ter mais mérito do que o judeu falastrão, assim também importará menos onde o cara comunga do que saber quanto ele faz daquilo que o Rabi Nazareno, o Médico das Almas, nos ensinou.
Acho que a Sublime Via, para muito além do poder de persuasão com o qual as almas dos Apóstolos foram infundidas, foi o que fez a Mensagem de Jesus chegar tão longe no início. Essa convivência fraterna é que unia, tão intimamente, os que eram curados de suas misérias terrenas, alimentados por mãos caridosas que jamais tinham sido vistas, vestidos e consolados por anônimos desconhecidos e agraciados com alguma esperança quanto ao futuro.
Dogmas? Discussões? Isso só importava, realmente, aos cultos cidadãos de Atenas, Roma, Alexandria ou Jerusalém. Nas aldeias esquecidas do Alto Egito, dos desertos da Síria, dos confins da Armênia ou da Pérsia, o que conquistava os corações das pessoas, senão a veia mística do Cristo? O que levou Antão ao deserto, senão a guerra contra o fastio do Mundo e contra o Demônio dos detalhes? Qual era o ideal dos primeiros monges, senão ir encontrar, de forma ávida, a si mesmos na contemplação do infinito de Deus? Fazer o Bem sem olhar a quem. Misericórdia e Caridade.
Onde estiver o teu tesouro, aí também estará o teu Coração.
(Mateus 6, 21)
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NOTAS
[1] Sobre as egrégoras, vide: MEDEIROS, M. Em sintonia com as egrégoras. Entrada (online), publicada em 21 de novembro de 2012. Site: Estudo Teosófico. Disponível em < http://goo.gl/fQwUrw >. Acesso em 25 de julho de 2015.
[2] Cf. Atos dos Apóstolos 9,2.
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