Numa certa pregação, Jesus teria dito aos seus discípulos e ouvintes que eles são o “sal da Terra” e a “Luz do Mundo” ¹. Devemos tentar entender essas expressões como paralelas e conjugadas. Através da via analógica (como aquela utilizada por Hermes Trismegistos²), sabemos que o Sal e a Luz são, para o Universo, semelhantes ao que são para a Terra; para o homem como o são para a mulher; para o que é pequeno como para o grande. Andiamo!
Deixando, por ora, de abstrair e descendo ao nosso pobre patamar humano, vemos o outro (ou outra), que elegemos para amar, como uma projeção de: a) nós mesmos; b) nossas aspirações mais urgentes; e c) do fim planejado de toda a nossa caminhada. Pois, quando digo que a pessoa é minha, quero significar que meu Mundo e o que eu sou está condensado na visão que tenho dessa pessoa. Sim, não há aí, necessariamente, vil sentimento de posse, mas um desejo de que meu Mundo se expanda e se realize, plenamente, no(a) outro(a).
Como cantava Raul Seixas, em Meu Amigo Pedro, “cada um de nós é um Universo” em expansão e retração constantes. Nossa Alma também respira e vive entre fluxos e refluxos. Quando um Mundo alcança o outro e com este se identifica, há o casamento entre um Rei e uma Rainha. Para que tudo cresça neste casamento, nem sempre nossos princípios bastam para manter a expansão e garantir a colheita de bons frutos. Todas as coisas no Universo crescem em pares, invariavelmente. Isso é Amor, a amizade íntima entre os seres, e ele traz Vida em abundância, mas também conflitos (como as contrações, sempre mais agudas, do parto).
Segundo Paulo de Tarso, “a letra mata, mas o Espírito vivifica”³, o mesmo Espírito cujo Amor arde em nosso peito e renova todas as coisas visíveis e invisíveis. Assim, nossos ferrenhos princípios, que deveriam reger nossa Vida, tornam-se obsoletos (quando não matam e sufocam como espinhos) se lhes falta uma faísca, uma chama, um fogo que é colocado em nosso peito tal qual brasa viva. O Sal da Terra, que é o tempero do equilíbrio, quando não serve mais para equilibrar, é pisado e lançado fora. Quando o sal não dá sentido ao trabalho diário e nossos sofrimentos, dando regras e constância ao nosso caminhar, torna-se algo repugnante.
É necessária, então, a Luz do Mundo, que ilumina e aquece as Almas conjugadas, conferindo-lhes o principal motor da Vida, que é a Vontade, como a do Sol Invictus, invencível e imparável. Nada o detém, nem as leis da Natureza, nem as Trevas. A Luz destrói as correias da Noite fria, dissolve o orgulho pétreo e desata os nós. Nada importa tanto quanto o Caminho sob a Luz do Mundo, nem mesmo nossas vãs projeções egoístas ou qualquer outra expectativa.
Há uma meta suprema. A Luz nasce no Leste e se põe no Oeste. Por vezes, voamos com asas de cera e, tal qual Ícaro, despencamos das nuvens. Escalamos montanhas com pícos gelados, atravessamos bosques perigosos, enfrentamos feras e sorvemos a água das cristalinas fonte. Para quê, mesmo, tudo isso? Respondo-lhe, caro(a) leitor(a), por mim: para não perdermos de vista a Luz do Mundo e a Vontade de viver.
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NOTAS
¹ Mateus, 5: 13-16.
² “O que está acima é como o que está abaixo. O que está dentro é como o que está fora.” (Tábua de Esmeralda, por Hermes Trismegistos).
³ 2ª Carta de Paulo aos Coríntios, 3:6.
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